Cecília e eu - parte 10 (final)

E assim chegamos ao final do percurso. Não ao final da minha relação com Cecília, claro, pois essa vai até o fim da minha vida, imagino.
Ao longo desses anos, desde aquele distante dia em que topei com os versos que mudaram a minha vida, Cecília tem sempre estado presente.
Nesses mais de 35 anos, escrevi muito sobre a obra da minha autora preferida. Foram muitos artigos, comunicações em congressos, ensaios, palestras. Não saberia fazer a conta exata, porque às vezes uma palestra acaba virando artigo, uma comunicação num congresso vira ensaio numa coletânea... Mas acho que dá pra dizer que meus escritos sobre Cecília andam pela casa das dezenas. Imagino que nem tudo se salva, mas tenho orgulho de alguns deles, porque acho que terão de fato contribuído para a compreensão da obra de Cecília.
Um dos meus maiores orgulhos é o de ter colaborado na edição da Poesia completa de Cecília Meireles que saiu no ano do centenário de nascimento da poetisa, 2001. É uma edição muito cuidada, em dois volumes, dentro de uma caixa, feita pela Nova Fronteira e organizada pelo professor Antônio Carlos Secchin:
No primeiro volume, entre os textos que fazem a introdução à obra, está uma seleção da crítica sobre Cecília feita por mim, a partir ainda daquele material que compõe o meu livro. Embora a edição esteja agora fora de circulação, fico feliz de ter feito parte dela.
Mas além de ter escrito sobre Cecília, nesses anos em que trabalhei na universidade, pude também orientar muitos alunos que tinham interesse em estudar a obra da escritora. Foram quase 20 trabalhos sobre Cecília que passaram por mim, nos níveis de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado. Alguns desses meus ex-orientandos estão hoje trabalhando em universidades também, o que me deixa muito feliz e com a esperança de que de alguma maneira a minha paixão por Cecília continue produzindo frutos através do trabalho deles.
E agora, que já estou bem perto de me aposentar, tomei a decisão de doar toda a minha coleção ceciliana para o mesmo Centro de Documentação Alexandre Eulalio da Unicamp, para o qual eu já tinha doado o material do mestrado. Livros, cartas, rascunhos, material audio-visual, enfim, tudo o que colecionei ao longo desses anos vai ficar reunido na "Coleção Cecília Meireles" no CEDAE.
Minhas preciosidades cecilianas foram embaladas em 7 caixas grandes e, no mês passado, foram levadas para Campinas. Aqui está o momento da assinatura do contrato de doação:



Não digo que não sofri um pouco com a partida, mas ao mesmo tempo sinto que fiz o que deveria fazer. A universidade pública me deu muitas coisas, e creio que é justo que eu devolva. Doei o que tinha de mais precioso. Além disso, não acho justo que uma coleção tão abrangente como a que consegui fique guardada só comigo. Quero que mais gente possa ter acesso a tudo o que acumulei nesses anos.
E pra falar a verdade, também tinha muito medo de morrer antes de poder dar um destino aos meus guardados e de repente ver minha coleção desmanchada e dispersa nos sebos por aí. Agora eu tenho a certeza de que todas as minhas relíquias vão ficar sempre juntas! E disponíveis pra quem se interessar por elas!
Em casa, guardei poucas coisas, que mais tarde deverão ir para o CEDAE também. Uma delas, a edição da Poesia completa de que falei há pouco. Além disso, guardei algumas edições da Obra poética da Editora Aguilar, entre elas, aquela mesma de 1967, idêntica àquela da minha escola, onde li pela primeira vez a poesia de Cecília:



Comentários

  1. Adorei esta história toda. E, como já falei pessoalmente, achei sua doação incrível: poucas pessoas têm não só este desprendimento como esta consciência de dividir com os outros. Well done, queridona!

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  2. Muito legal ter acompanhado o percurso! Agora o CEDAE tá pra lá de recheado... :)
    Beijão,
    Márcia.

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  3. Lindo texto e linda história...! e o mais importante de tudo, a doação para que se dê continuidade à difusão do conhecimento daquilo que voce amelheou durante uma vida toda... parabéns!

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  4. Linda história! E doar a sua coleção fechou a história com chave de ouro! Parabéns!

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  5. Foi um prazer acompanhar os relatos sobre Cecilia Meireles: uma bela história, muito bem narrada. Parabéns Ana, pelo texto ágil e sua generosa decisão de doar a sua coleção tão preciosa.

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  6. Cecilia deve estar orgulhosa de você.
    Obrigado, Ana, obrigado. Não gosto mais de você, depois deste relato: já gostava e tinha aprendido a admira-la; seu relato e gesto não me surpreendem. Referendam, sim, a pessoa que você é.
    Te abraço.

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    1. Claudio, obrigada pela companhia aqui. Agora você entendeu a resposta para aquela sua pergunta do começo?

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  7. Gostei demais da novela ceciliana! Foi muito bacana acompanhar o relacionamento de vocês.

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  8. Ana, pena que o seu relato tenha chegado ao fim... A foto publicada neste capítulo evidencia o seu sentimento de profundo e belo desprendimento em benefício da grande obra produzida pela Cecília. Um ato que merecia reflexão... A grandeza da obra de Cecília 'exige' toda a divulgação possível para que as novas gerações tenham conhecimento da perfeição e beleza do que nos legou nossa maior poeta, em minha opinião. Abraços e obrigada, Selma.

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  9. Cecilia e Eu
    Apreciei bastante o relato de Ana Maria Domingues de Oliveira sobre as coisas e as pessoas ligadas à grande escritora, desde os azulejos, passando pelo Cemitério , até o episódio com o poeta Fernando Pessoa, cuja estátua, no café do Chiado, tive o prazer de conhecer,i. anos depois, por iniciativa da própria autora. A narrativa é minudente e, em certos pontos, até comovente. Parabéns, Ana
    Sylvio

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    1. Seu Sylvio, obrigada pela leitura e pelas palavras gentis!

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